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Antes do advento do automóvel, as movimentadas “ruas principais” eram o centro de muitas cidades e bairros. Essas ruas principais eram lugares plenos de experiências sensoriais de escala humana. A invenção do carro no século 20, juntamente com novos meios de transporte de produtos, modificou o desenho das ruas e o lay-out das cidades. Muitas cidades foram submetidas a mudanças de infraestrutura em larga escala, transformações de seus centros e proliferação do uso de funções únicas. O espaço urbano foi monopolizado, tomado das pessoas e dividido em tipos de função. O projeto moderno para edificações e as mudanças no mercado imobiliário do comércio (por exemplo, a emergência de supermercados e shopping centers) enfraqueceram as ruas comerciais, seus plinths e a esfera pública.
O renascimento da cidade trouxe consigo muita discussão (e ação) para recuperála como um lugar para pessoas. “A Cidade ao Nível dos Olhos” é um apelo pelo retorno das ruas com escala humana. Plinths ativos e diversificados contribuem para uma esfera urbana dinâmica, economicamente viável e sustentável.
A ideia de “A Cidade ao Nível dos Olhos”, entretanto, não é nova: muitos pensadores icônicos do planejamento urbano influenciaram o desenvolvimento do planejamento e do desenho urbano em nossas cidades com uma escala humana. Princípios estabelecidos de longa data por Kevin Lynch, Gordon Cullen, Jane Jacobs, Jan Gehl, William H. Whyte, Allan Jacobs e Fred Kent (entre muitos outros) são relevantes para o planejamento atual. Temos muita satisfação de incluir artigos de dois deles (Fred Kent e Jan Gehl) neste livro. E também queremos dar o devido crédito aos demais e suas muitas publicações.
Kevin Lynch (1918-1984) foi um planejador urbano norte-americano que estudou em Yale e no MIT, tendo ensinado posteriormente no próprio MIT por 15 anos. Seus trabalhos mais conhecidos são The Image of the City (1960) e Good City Form (1984). O primeiro foi um projeto de pesquisa de 5 anos estudando as formas pelas quais as pessoas usam, percebem e absorvem a cidade. Esse livro organizou a cidade em cinco elementos de imagem que ele chamou de trajetos, bordas, distritos, nós e pontos de referência. Ele também inventou a expressão “way finding” (jeito de achar) e muito vocabulário usado regularmente hoje em planejamento.
“…este estudo busca encontrar qualidades físicas que se relacionam com os atributos de identidade e estrutura na imagem mental. Isso leva à definição do que pode ser chamado de “imageabilidade”: aquela qualidade de um objeto material que lhe confere uma elevada probabilidade de evocar uma imagem forte em qualquer observador. […] Uma cidade altamente imageável (aparente, legível ou visível) nesse sentido peculiar pareceria bem formada, distinta, notável; ela convidaria o olho e o ouvido para mais atenção e participação. A apreensão sensível em tais ambientes não seria meramente simplificada, mas ampliada e profunda. Essa cidade seria aquela que poderia ser apreendida ao longo do tempo como um padrão de alta continuidade com muitas partes distintas claramente interligadas. O observador perspicaz e familiarizado poderia absorver novos impactos sensoriais, sem interrupção de sua imagem de base, e cada novo impacto tocaria em muitos elementos anteriores. Ele seria bem orientado e poderia se mover facilmente. Ele estaria altamente ciente do seu ambiente.” Kevin Lynch, The Image of the City, p. 9 -10
Gordon Cullen (1914-1994) foi um arquiteto e designer urbano inglês. Ele desenvolveu um olhar para ver as qualidades óbvias nas cidades britânicas. Ele viu que os lugares de grande beleza e de forte caráter tinham sido criados ao longo dos séculos e são desenvolvidos do ponto de vista de uma pessoa. Ele começou identificando e analisando essas essências da cidade britânica e as desenvolveu em lições para arquitetos e planejadores. Gordon Cullen é mais conhecido por sua obra Towscape, publicada inicialmente em 1961; edições posteriores foram publicadas sob o título The Concise Townscape (1971).
“A importância de tudo isso é que embora o pedestre caminhe pela cidade a uma velocidade uniforme, a paisagem das cidades é muitas vezes revelada por uma série de “empurrões” ou revelações. Isso nós chamamos de VISÂO SERIAL […] A mente humana reage a um contraste, à diferença entre as coisas, e quando duas imagens […] estão na mente ao mesmo tempo, um contraste vívido é sentido e a cidade se torna visível em um sentido mais profundo. Ela ganha vida através do drama de justaposição. A menos que isso aconteça, a cidade desfilará para nós inexpressiva e inerte.” Nessa […] categoria nós retornamos a um exame do tecido das cidades: cor, textura, escala, estilo, caráter, personalidade e singularidade. Aceitando o fato de que a maioria das nossas cidades foram fundadas há muito tempo, seu tecido vai mostrar evidências de períodos diferentes em seus estilos arquitetônicos e também em vários “acidentes” de lay-out Muitas cidades então exibem essa mistura de estilos, materiais e escalas”. – Gordon Cullen, The Concise Townscape, pp. 9-12
Dentre os escritores norte-americanos sobre planejamento urbano e economia urbana, Jane Jacobs (1916-2006) é provavelmente uma das mais famosas. Ela é mais conhecida por suas contribuições e críticas ásperas às políticas de renovação e desenvolvimento urbano do anos 1950 e 1960 e por seu livro The Death and Life of Great American Cities (1961). Durante um tempo em que a suburbanização norte-americana imperou, ela foi uma das poucas defensoras da cidade e da vida na cidade. Ela se opôs veementemente à renovação urbana e a muitos modelos de planejamento da sua época. Jacobs é renomada por seus conceitos “olhos sobre a rua”, desenvolvimento de uso misto e planejamento bottom-up. Suas minuciosas observações da vida e da função da cidade influenciaram o planejamento de muitas maneiras.
“Uma rua da cidade equipada para lidar com estranhos, e para fazer com que a presença de estranhos constitua a nossa segurança, como as ruas de bairros bem-sucedidos sempre fazem, deve ter três qualidades principais: Primeiro, deve ter uma clara demarcação entre espaço público e espaço privado. Espaços públicos e privados não podem infiltrar-se um no outro como fazem normalmente em ambientes suburbanos ou em projetos. Em segundo lugar, deve haver olhos para a rua, olhos pertencentes àqueles que poderíamos chamar de os proprietários naturais da rua. Os edifícios de uma rua preparada para lidar com estranhos e para garantir segurança de ambos, residentes e estranhos, devem ser orientados para a rua. Eles não podem virar suas costas ou laterais inexpressivas sobre ela e deixá-la cega. E terceiro, as calçadas devem ter continuamente muitos usuários, tanto para aumentar o número de olhos efetivos sobre a rua, como para induzir que um número suficiente de pessoas nos edifícios ao longo da rua olhem para as calçadas. Ninguém gosta de sentar em uma varanda ou observar pela janela uma rua vazia. Quase ninguém faz uma coisa dessas. Um grande número de pessoas se distrai observando a atividade da rua.” – Jane Jacobs, The Death and Life of Great American Cities, p. 35
Formado em Sociologia, William Whyte (1917-1999) começou a trabalhar como analista organizacional. Ao trabalhar na New York City Planning Commission em 1969, ele começou a se perguntar em que os espaços urbanos estavam atualmente resultando e usou a observação direta para descrever comportamentos em ambientes urbanos. Com o uso de câmeras, vídeo câmeras e notebooks, ele introduziu novas formas de pesquisa urbana e descreveu a substância da vida pública urbana de uma forma objetiva e mensurável. Essas observações foram desenvolvidas no “Street Life Project”, um estudo contínuo do comportamento de pedestres e da dinâmica da cidade, que eventualmente acabou levando ao livro e filme homônimo The Social Life of Small Urban Spaces (1980). Whyte acreditava nos espaços públicos como lugares onde as pessoas e o trânsito podem estar juntos. As observações e ideias de Whyte ainda são relevantes para o modo como usamos nossas cidades e ruas.
“O que atrai as pessoas, ao que parece, são outras pessoas. Se eu insisto neste ponto, é porque muitos espaços urbanos estão sendo concebidos como se o contrário fosse verdade, e que do que as pessoas mais gostam seriam os lugares onde elas nunca vão. As pessoas muitas vezes se expressam seguindo essas linhas de raciocínio; é por isso que as suas respostas aos questionários podem ser tão enganosas. Quantos diriam que gostam de sentar no meio da multidão ? Ao contrário, elas falam de se afastar de tudo, e usam termos como ‘fuga’, ‘oásis’, ‘refúgio’. O que as pessoas fazem, todavia, revela uma prioridade diferente.” – William H. Whyte, The Social Life of Small Urban Spaces, p. 19
“Outra característica fundamental da rua é o varejo – lojas, janelas com displays, cartazes para chamar sua atenção, entradas, o entra-e-sai das pessoas. Novos e grandes edifícios de escritório foram eliminando lojas. O que as substituiu foi uma fachada de vidro através da qual você pode contemplar funcionários do banco sentados em mesas. Um trecho desse tipo já maçante o suficiente. Bloco após bloco deles cria um tédio avassalador” – William H. Whyte, The Social Life of Small Urban Spaces, p. 57
Allan Jacobs é um planejador urbano norte-americano e professor emérito da Universidade da Califórnia, Berkeley. Ele é muito conhecido por publicações e pesquisas sobre desenho urbano, bem como pela sua contribuição para o manual de desenho urbano da cidade de São Francisco. Elé é um ávido defensor das ruas multimodais que não separam os usuários. O seu abrangente livro Great Streets (1995), ilustra a interação dinâmica entre pessoas e ruas, e analisa os atributos específicos dessas ruas maravilhosas.
“Ruas maravilhosas exigem características físicas que auxiliam os olhos a fazerem o que querem fazer, devem fazer: movimentar-se […]Geralmente, são as muitas superfícies diferentes ao longo das quais a luz se move constantemente que mantêm os olhos interessados: edifícios separados, muitas janelas ou portas separadas, ou alterações de superfície. […] A complexidade visual é o que é preciso, mas não deve ser tão complexa a ponto de tornar-se caótica ou desorientadora. […] Além de ajudar a definir uma rua, separando o espaço dos pedestres do dos veículos e proporcionando sombra, o que torna as árvores tão especiais é o seu movimento; o movimento constante de seus galhos e folhas, e a luz mudando continuamente, se infiltrando por entre elas, através delas e em volta delas. ” – Allan Jacobs, Great Streets, p. 282
“Geralmente, mais edifícios ao longo de um determinado trecho de rua contribui mais do que menos edifícios. […] Com mais edifícios, há chance de haver mais arquitetos, e eles não farão os projetos todos iguais. Há mais colaboradores para a rua, mais e diferentes participantes, os quais todos agregam interesse. […] Os diferentes edifícios podem […] ser projetados para uma mistura de usos e destinos que atraem misturas de pessoas de toda uma cidade ou bairro, o que, portanto, ajuda a construir a comunidade: cinemas, lojas de diferentes tamanhos, as bibliotecas “ – Allan Jacobs, Great Streets, p. 297 – 298
G. Cullen (1971), The Concise Townscape, Architectural Press, Oxford UK
A.B. Jacobs (1995), Great Streets, MIT Press, Cambridge MA
J. Jacobs (1961), The Death and Life of Great American Cities, Random House, New York
K. Lynch (1960), The Image of the City, MIT Press, Cambridge MA
W.H. Whyte (1980), The Social Life of Small Urban Spaces, The Conservation Foundation, Washington DC
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