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Por 7.000 anos, desde que as primeiras cidades se formaram, as ruas tiveram um papel muito distinto. Pessoas se encontravam nelas, se deslocavam e vendiam os seus bens. Crianças se reuniam e brincavam nas ruas (sim, nas ruas). Ruas eram a extensão das nossas casas e salas de estar. Eram de domínio público e provavelmente os espaços mais democráticos na história da humanidade.
Pois uma mudança massiva de paradigma alterou a nossa percepção das ruas. O carro. Na urbanização rápida do final dos anos 1800 e no início dos 1900, engenheiros eram os heróis urbanos da hora, enfrentando todos os desafios urbanos atribuídos a eles. Quando o automóvel se tornou mais disseminado no início dos anos 1900, as pessoas ainda estavam acostumadas ao uso da rua como sendo seus domínios. Colisões se tornaram triviais, pessoas (crianças inclusive) morreram e ninguém tinha a solução para esse problema de insegurança devida ao trânsito acelerado. Quase em desespero, o encargo foi passado para os engenheiros, em colaboração com a indústria de automóveis, que viu ali uma oportunidade. Quase que de um dia para outro, as ruas passaram a ser vistas como utilidades públicas, como a eletricidade ou o esgoto. Eram quebra-cabeças para ser resolvidos com equações matemáticas. Cidadãos foram envolvidos em novos conceitos, chamados calçadas e faixas de pedestres, e as crianças em playgrounds cercados. No final, agora vazias, as ruas estavam prontas para os carros.
Depois de 100 anos de engenharia de trânsito, onde pela primeira vez em 7.000 anos a ciência foi aplicada a planejamento social e às ruas humanas, ninguém descobriu como diminuir o congestionamento do trânsito ou reduzir mortes e lesões. Claro, há mais tecnologia para coletar e dados a analisar, porém a mentalidade não evoluiu. Estamos vivendo em cidades controladas por modelos e equações matemáticas, avaliações do impacto, análises de custo-benefício bizarros e muitas vezes desatualizados. Em muitas cidades no mundo, adicionar uma faixa cicloviária separada, alargar a calçada, ou implementar medidas para desacelerar o trânsito leva anos de planejamento – porque não cabe naquele modelo matemático gerado pelo computador, lá no departamento de engenharia.
A urbanização está aumentando, hoje mais do que nunca. Os congestionamentos de trânsito (ainda) estão assolando as nossas cidades, desperdiçando o nosso tempo, dinheiro, energia e as nossas vidas. Precisamos de novas soluções com urgência.
A bicicleta faz sentido nas cidades. É um modo de transporte de baixo custo e eficiente. É sustentável, é saudável – porém esses são benefícios subalternos e não o âmago da questão. As pessoas querem ir de A para B da maneira mais rápida possível. Em cidades como Copenhague e Amsterdã, isso significa andar de bicicleta. Investir na infraestrutura cicloviária é um movimento moderno e inteligente para uma cidade fazer. Estudos da Dinamarca nos dão conta de que por cada quilômetro pedalado a sociedade se beneficia de uma rentabilidade líquida de 23 centavos. Por cada quilômetro percorrido por carro sofremos de uma perda líquida de 16 centavos. As nossas cidades precisam de soluções modernas de mobilidade e a bicicleta comprova incessantemente que ela pode oferecer soluções.
Uma chave para modernizar as nossas cidades é um bom desenho. Nós todos temos alguma relação com design e, num certo nível, nós todos somos designers. Um bom projetista se coloca na posição do usuário do produto: o ser humano do outro lado do processo de design. Projetistas pensam sobre funcionalidade, usabilidade. Projetar uma cidade para pedestres ou ciclistas – ou qualquer aspecto de qualidade de vida numa cidade – deve ser igual a projetar qualquer outro produto para o mercado. Deve ser como projetar uma cadeira. É fácil e intuitivo usá-la e sentar-se nela? Imagine se andar de bicicleta ou caminhar numa cidade fosse tão fácil e intuitivo.
Planejar para uma cidade de bicicletas naturalmente exige a mistura certa de infraestrutura, comunicação, transporte público e políticas que apoiem os seus cidadãos, e consigam que eles pedalem. O desenho urbano tem um papel preponderante também na criação de um ambiente urbano atraente, na “escala de vida”, para pessoas que querem pedalar, sair dos seus carros, mudar o seu comportamento. Uma cidade atraente e cativante ao nível dos olhos fará com que o estilo de vida mude facilmente e logicamente. Com um processo efetivo de design, a infraestrutura cicloviária seduz as pessoas a usá-la. Faz com que a bicicleta seja o caminho mais rápido e fácil (e irresistível) de A para B, e as pessoas pedalarão.
A engenharia tem um papel reduzido em algo orgânico e humano como as ruas urbanas. Os fundamentos das boas cidades do futuro devem ser construídos com base em observação humana – antropologia e sociologia – e desenho. (e não podemos esquecer de escutar com cuidado os pensamentos e observações das mentes que lideram na área) São as pessoas de uma cidade que a definem. Devemos estudar os seus comportamentos, os seus padrões e movimentos, desejos e necessidades, para que possamos entender como desenvolver melhor as nossas cidades, como criar ruas mais acessíveis para mais pessoas.
Para nós, ficou o seguinte: mudar a percepção dos cidadãos. A percepção de como as pessoas podem se deslocar pelas cidades. Como fazemos isso? Não adianta dizer para as pessoas para elas andarem de bicicleta ou salvarem o planeta. Isso não funciona. Estimula os subgrupos e apenas estimula as pessoas a se posicionarem, no final, contra os carros, bicicletas contra carros e pessoas contra pessoas. Campanhas devem ser focadas no cidadão e na bicicleta, como a cidade de Munique fez tão bem, ao invés de se centrar na promoção de estilos de vida ecológicos, saudáveis. Segurança e o uso de capacete não devem estar na agenda. Sabemos muito bem que a campanha para uso de capacetes em Copenhague causou uma maior e repentina diminuição de pedaladas.
Dizer para as pessoas o que elas devem fazer muitas vezes complica desnecessariamente a questão e resulta em mudanças de percepções para pior. Não precisamos complicar as coisas desnecessariamente – desde décadas, andar de bicicleta é e foi uma atividade muito normal para os cidadãos.
Temos que mostrar às pessoas. Temos que projetar e construir infraestrutura da qual há provas de que funciona e que pode ser usada o ano inteiro. Deve ser simples, eficiente e intuitiva. Deve mirar 99 por cento, não os poucos de lycra que passam a todo vapor com as suas bicicletas “estilosas”. Priorizar políticas para trânsito público em massa mostrará às pessoas. Estreitar as pistas dos carros para gerar espaço para outros tipos de transporte mostrará às pessoas. Diminuir os limites de velocidade e implementar medidas para desacelerar o trânsito mostrará às pessoas. Estabelecer sistemas de bicicletas coletivas mostrará às pessoas. Projetos pilotos proporcionam uma boa maneira para experimentar, ver se uma ideia funciona. Depois, fazê-los permanentes.
Isso não se refere apenas a infraestrutura cicloviária, serviços para pedestres, desacelerar trânsito, desenho urbano. Isso é sobre erigir monumentos. Monumentos que nós, as pessoas, desenhamos, e nos levantamos para criar cidades com qualidade de vida. São monumentos do passado, do presente e do futuro tão importante. Monumentos que melhoram as cidades. Nós somos os arquitetos e desenhistas. Essas são as nossas cidades. Está na hora de trocar a pergunta “Quantos carros podem passar pela rua?” para “Quantas pessoas podem passar pela rua?” A resposta à última se torna muito mais moderna e visionária. E mais simples. Oh, e mais barata.
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